“A História é dos
povos e das nações não se escreve com a covardia dos que se entregam mas com a
bravura e a intrepidez dos que resistem”. (Hélio Fernandes)
Foi no mês de julho
de 1957 que Fernando de Noronha recebeu o seu último preso político da ditadura
militar de 1964: o jornalista HÉLIO FERNANDES, diretor do jornal “Tribuna da Imprensa”, do Rio de Janeiro.
Intimado para ir à Polícia do Exército “prestar esclarecimentos”,
por ter publicado – logo depois
do acidente aéreo que matou Castelo Branco - na primeira página do jornal que
dirigia, dois editoriais com críticas ao ex-Presidente, que desagradaram os líderes da
Revolução de 1964, teve sua detenção consumada, sendo levado para apanhar suas roupas em casa,
despedir-se da família e sair correndo para o Galeão, onde tomou o C-54 da
FAB que o levou a Fernando de Noronha. E ele ficou no
Arquipélago, distante de tudo, sem companheiros de infortúnio que amenizassem seus
dias, porque todos os outros presos de 1964 já haviam voltado para o continente
e seguido suas vidas.
Suas reflexões eram dolorosas... “Estou sozinho nesta terrível ilha de
Fernando de Noronha, que o medo dos homens escolheu para refúgio dos que têm
coragem.” Sua prisão fora cumprida por ordem do Ministro da
Justiça, impondo-lhe “como domicílio
determinado, até ulterior deliberação, o Território Federal de Fernando de
Noronha”, então governado pelo
Cel. Jayme Augusto da Costa e Silva. Aí permaneceu incomunicável, preenchendo
seu tempo lendo livros ou escrevendo memórias, que resultariam na publicação da
obra: “Recordações de um Desterrado na Ilha de Fernando de Noronha”, publicado em 1980, falando do tempo de cativeiro, grande
parte dele registrado ainda na ilha, em mais de 300 páginas datilografadas, nessa
obra “de recordações, revelações e reflexões.”.
Impedido
de se comunicar com qualquer pessoa ou receber visitas, somente 18 dias após sua chegada, a primeira
pessoa importante que a visitá-lo foi Carlos Lacerda, acompanhado de deputados
e advogados, sem nenhuma divulgação permitida. Também lhe foi possível enviar,
por telegrama do Cabo Francês (instalado ali desde a década de 1920), uma
mensagem para um jornalista do Jornal da Tarde, no Rio de Janeiro, comentando o
isolamento prisional em Fernando de Noronha, onde estava “cercado de solidão por todos os
lados”, vivendo “noites terríveis e cada vez mais longas”,
numa ilha “perdida no fim do mundo” e que “o importante seria não revidar
injustiça com injustiça”. Só no livro de memórias isso viria a ser
registrado.
Ao
voltar para o continente, transferido de Fernando de Noronha para Pirassununga,
vinha sob ordens de que “não poderia mais escrever e publicar artigos,
nem mesmo sob pseudônimo, em lugar nenhum”. Era a censura claramente
exercida, naquele conturbado tempo.
Há uma curiosidade dessa época que merece registro. Numa madrugada de
agosto, tendo perdido o sono, Hélio Fernandes tentou escrever. Desistiu.
Caminhou pelo alojamento e viu, tapando uma brecha, uma página rasgada de um jornal
do Recife (que não identificou qual seria). “Por inspiração divina”, diz ele, vai
olhá-la.e encontra,”um dos mais bonitos poemas da língua portuguesa.
Não resistiu. Copiou o poema: “Tece, tece, tece, tece, bem tecida essa
canção, um a um, fio por fio, como faz o tecelão...” Passou a ler e
reler o poema “centenas de vezes” e sugere “que ele deveria ser adotado como o hino oficial da
luta pela libertação econômica nacional”. No recorte estava o
nome do poeta pernambucano, autor daquela maravilha... E ele escreve,
emocionado: “Marcus Accioly,
poeta genial, que eu não conheço, eu te saúdo e te agradeço pelo poema que
tanta companhia me fez, em Fernando de Noronha”.
Julho está a acabando e é bom lembrar um acontecimento tão significativo na
história noronhense!!!