sábado, 5 de junho de 2010

FALANDO DE CIGANOS EM FERNANDO DE NORONHA

O Jornal do Commercio publicou, no dia 26/05/2010, o Caderno Especial "NO RASTRO DOS CIGANOS", resultado de uma interessante pesquisa sobre esse povo nômade, tão perseguido através dos tempos e que conserva tradições milenares, numa evidente transmissão, de pais para filhos, de uma Cultura fascinante e incompreendida por muitos. De parabéns estão as jornalistas Verônica Falcão e Cleide Alves, pela riqueza nos dados abordados e a fotógrafa Hélia Scheppa, pelas imagens reveladoras!

A lamentar apenas, que tenha ficado fora dessa retrospectiva, a histórica presença dos ciganos do Brasil em Fernando de Noronha, a partir de 1739, assinalada por diversos historiadores, embora as comprovações desse envio sejam quase inexistentes. O que se sabe é que cronistas mencionaram o fato, como Pereira da Costa, sem explicitar detalhes e outros tantos também o repetiram, acreditando-se que a deportação dos ciganos para a Ilha, naquele momento, seria uma tentativa preconceituosa de "limpar-se a raça" , isolando-se esses homens e mulheres por suas atitudes consideradas clandestinas e marginais.

No imaginário popular, esse momento histórico talvez tenha sido a razão do surgimento da lenda "O cajueiro da cigana", mencionada poor vários historiadores e poetizada no final do século XIX pelo poeta paraense, ex-seminarista, revolucionário e ardente apologista do protestantismo, Gustavo Adolpho Cardoso Pinto, que foi cumprir pena em Fernando de Noronha, aos 19 anos de idade, por assassinato e roubo e, lá estando, criou un lindo poema (entre tantos) com essa lenda, publicado num livro de versos seus intitulado "Risos e Lágrimas".

Suas rimas têm sabor agreste e resgatam essa e outras velhas histórias, perpetuadas pela oralidade e criam uma aura de verdade naquilo que tanto incomodou os estudiosos do tema "Noronha", em todos os tempos. Os versos são mencionados por Gaston Penalva, Pereira da Costa, Mario Melo e Beatriz Imbiriba, todos autores de obras sobre a Ilha.

Diz ele:"Conservaram as tradições/ Que esbelta e linda Cigana/ Tinha, aqui, pobre cabana/ Nestas ermas solidões;/ Certo a buena dicha lia/ Porem disto não vivia. Mas certos amores vendeu.../ Era bela o mais quem sabe?/ Dizer a mim não me cabe,/ Depois dizem que morreu,/ E por memória deixou/ Esta árvore que plantou/ Desde então, nesta paragem/ Junto deste cajueiro,/ Aparece ao caminheiro/ Um eqüestre personagem;/ Fronte altiva e marcial,/ Vestido de general./ Quantas vezes, diz a gente/ Que um vulto - rara beleza,/ Pelas formas - com certeza,/ Mulher - alma padecente,/ Se vê perdida na estrfada,/ Como quem vai de jornada./ Não se sabe o que julgar/ Dessa estranha aparição..."

O poema segue, contando as agruras daquela vida degredada, no dizer de um poeta sem liberdade, que fez das histórais do lugar onde vivia o "mote" daquilo que escrevia. E essa é uma informação preciosa, quando se está resgatando o saber e as vivências do povo cigano.

Também a Escola de Samba Estação Primeira de Mangueira, em 1995, ao levar Fernando de Noronha para a Sapucaý, fez de "O Cajueireo da Cigana" um belo carro alegórico, carnavalizando a lenda, seguido de todo uma ala de ciganos, homens e mulheres, que mostravam ao mundo - naquele momento - a histórica presença cigana na Ilha, informação que muitos poucos sabiam (e não sabem, até hoje). Pena que o Caderno Especial de agora deixou de fora dados tão curiosos...

Mas isso vem a calhar, no momento em que o Ministério da Cultura - MinC, por meio da Secretaria da Identidade e da Diversidade Cultural (SID), instituiu o Prêmio Culturas Ciganas 2010, que teve suas inscrições abertas no dia 16 de abril e que serão encerradas no dia 12 de julho próximo. A competição quer premiar 30 iniciativas que envolvam trabalhos individuais ou coletivos, que fortaleçam as expressões culturais ciganas e contribuam para a continuidade e a manutenção das identidades dos diferentes clãs e povos presentes no Brasil, que somam mais de meio milhões de pessoas.

Bela iniciativa federal! Tão oportuna quanto essa, do Jornal do Commercio, de fazer a publicação desse admirável "NO RASTRO DOS CIGANOS", com que fomos todos nós - os leitores - premiados nesse final de maio, mesmo que a saga noronhense tenha ficado de fora.
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Ilustração: protótipo de um dos carros alegóricos da Mangueira, em 1995, criação do carnavalesco Ilvamar Magalhães.

2 comentários:

Jean Gmack Gomes disse...

Prezada Marieta,

Interessante texto a respeito da cultura cigana, principalmente pela inciativa do Ministério Cultura em instituir o Prêmio Culturas Ciganas 2010.

Bem como o poema de autoria do meu conterrâneo Gustavo Adolpho Cardoso Pinto, egresso do Presídio de Fernando de Noronha.

Parabéns pelo blog.

Jean Gmack Gomes disse...
Este comentário foi removido pelo autor.