segunda-feira, 1 de setembro de 2008

MESTRE SALUSTIANO - UM ORGULHO PARA PERNAMBUCO QUE SE FOI...



Houve um tempo – e já faz algum tempo – que quem passava no Jardim Fragoso, próximo à FUNESO, apreciava um “terreiro” de festas, muito simples, mas de uma energia contagiante... Quantos alunos, a caminho de sua obrigação discente, não pararam por breves momentos, para ver a alegria e a verdade daqueles “brincantes”, que varavam madrugadas, e ali estavam quase todas as noites. Quantos professores, também.

Um dia, minha curiosidade aguçou-se e eu também parei. Fiquei pouco tempo, da primeira vez. Fui embora dar aulas com a sensação de estar diante de um verdadeiro mestre na arte popular e decidi que voltaria. Assim o fiz muitas vezes, até o dia em que o líder daquele “brinquedo” aproximou-se, com seu riso largo e inesquecível, para perguntar-me: “em que posso servir a madama?” Disse-lhe sem pestanejar: “Que tal o senhor ensinar sua arte nas escolas de Olinda?”. E ele, talvez até desconfiado, não teve dúvida em dizer que “a gente conversava sobre isso”. Marcamos o encontro para o dia seguinte, na Secretaria de Educação e Cultura do Município, onde era eu a titular. Este foi o meu primeiro encontro com Salustiano, o primeiro de uma série que se seguiria, de descobertas do extraordinário artista que me havia atraído tanto, com seus festejos pobres e singelos, mas marcados pela força daquilo que é genuinamente popular.

Pouco tempo depois o Mestre Salustiano estava nas escolas de bairros populares de Olinda... A estratégia para remunerá-lo foi discutida e autorizada pelo Prefeito Germano Coelho e, desde o primeiro momento, foi sempre como “Mestre” que ele foi tratado. Mestre do maracatu. Mestre da ciranda. Mestre do mamulengo. Mestre do cavalo marinho. Mestre, sem vida acadêmica, doutorado nas estradas da vida e portador de talentos evidentes. Ainda naquela gestão, o Carnaval ganharia seu primeiro “Encontro de Maracatu Rural”, um lindo cortejo de grupos de maracatus pelos sítios históricos, trazidos e coordenados por ele, atividade que entrou no calendário cultural da cidade de forma permanente.

Passou-se o tempo. Olinda havia ganho a chance de aprender a fazer arte com um artista de verdade. A FUNDARPE percebeu o talento do Mestre.. E lá se foi ele, para a primeira experiência a nível estadual, levado pelos mãos de Leda Alves. Depois, o encantamento se deu com o grande Ariano Suassuna, que o quis na assessoria da sua Secretaria de Cultura, mesmo que – como contam – ele tivesse reagido de forma muito jocosa ao convite. Chamado por Ariano para “ajudá-lo a escrever coisas de cultura”, ele teria dito: “mas eu nem sei escrever...” E Ariano recrutara, de forma prática e definitiva: “Escrever eu sei. Eu quero é que você pense!”. Estava formada aquela “dobradinha” que haveria de carregar Salustiano do seu terreiro, para investir no sonho chamado “Ilumiara Zumbi”, na Cidade Tabajara, ainda em Olinda.

Novamente aí a vida nos aproximou muito. O pedido de Ariano para que os Técnicos da SEPACTUR elaborassem o projeto do Ilumiara foi a razão. E voltamos a nos encontrar, a conversar, porque era ali que eu agora servia à Olinda, como Secretária... Idas e vindas naquele espaço ainda descampado. Idéias. Projetos sendo propostos... E o sonho de Salustiano tornou-se concreto e assim o é até hoje.

O Governo Estadual o considerou “PATRIMÔNIO VIVO DE PERNAMBUCO”, dando-lhe uma aposentadoria e a honraria da escolha, reconhecendo nele um verdadeiro Mestre do Saber Popular, como em outras esferas já o haviam reconhecido como “Mestre por notório saber”. Este homem, que crescera pelas roças do interior do Estado, vendo aflorar em si dons que desconhecia e desenvolvendo esses dons, viera e vencera na cidade grande. Este homem, que enfrentou uma platéia de idioma desconhecido, em Santiago de Cuba, no “17º Festival Latino-Americano de Cultlura”, a todos convenceu porque sua Arte era especial. Este homem foi pai de muitos filhos e delegou para quase todos a força do seu saber, iniciando-os nos brinquedos que tão bem conduzia e a eles repassando essa herança invejável...

Um dia, estando ele se apresentando na festa do Bonfim de Olinda, minha filha adolescente, fascinada com o domínio do público que ele mostrava, com as cantigas improvisadas, com sua rabeca tão bem tocada, fez um comentário que eu jamais esqueci: “se esse homem tivesse estudado, o que ele hoje não seria...”. Precisa não, filha, disse eu... Esse nasceu para ser grande, mesmo sem estudos formais. Esse, é o Mestre Salustinano - PATRIMÔNIO DE PERNAMBUCO - que se foi agora , para a derradeira viagem, encantando-se, para sempre!

Sua herança permanecerá, graças a Deus!

Um comentário:

Anônimo disse...

Bom dia Marieta!

Lendo o seu texto, fico sabendo de mais um pouco da história do nosso grande Mestre!

Informações essenciais para quem quer estar por dentro da vida do Mestre Salustiano.

Um beijão